Patrícia Poeta foi cancelada. O que isso significa para a vida de uma pessoa, não faço ideia. Mas, segundo as regras das redes sociais, pode ser um evento devastador para o alvo do cancelamento. É o que informam recorrentes notícias sobre esse tipo de fenômeno que tomou conta do mundo contemporâneo desde a chegada do Metaverso. Em situações mais graves, o desfecho tende a ser trágico, com episódios até de suicídio.
A jornalista que trocou o jornalismo pelo entretenimento, ao que parece, caiu numa armadilha planejada por sua própria turma de trabalho, especificamente a direção do programa Encontro, apresentado por ela nas manhãs da Globo. O bafafá tem origem numa entrevista ao vivo com o pai de uma jovem assassinada em Cajamar, São Paulo.
Durante a entrevista, nesta sexta-feira 7, a apresentadora deu detalhes sobre a forma brutal como Vitória Regina de Souza foi morta. O problema é que, até aquele momento, as informações não haviam sido divulgadas pela polícia. Assim, o pai da vítima, que tinha apenas 17 anos, recebeu os dados estarrecedores naquele momento, ao vivo, num espetáculo televisivo para todo o Brasil. Ele parecia atônito com o que ouvia.
A reação pelas redes foi imediata e truculenta contra a apresentadora. No tribunal da internet, ela está condenada pela “atitude totalmente absurda”. Sua conduta, ainda segundo a sentença virtual, “ultrapassou todos os limites” e, além disso, “não pode ficar por isso mesmo”. O que propõem então os juízes atrás de telas e teclados? Pelos termos da revolta generalizada, Patrícia Poeta mereceria o linchamento sumário.
Falei em armadilha. Reportagem na Folha de S. Paulo informa que a jornalista não queria “dividir a tela” com o pai da jovem, que deu a entrevista de sua casa. Ela também teria dito que não seria correto dar aquelas informações que ainda não eram oficiais. Mas, na volta de um intervalo comercial, a direção do programa descumpriu o combinado. O entrevistado apareceu a seu lado na tela, e o texto para ela trazia os detalhes inéditos.
A presepada gerou uma crise na Globo e deve ter consequências. Mas por que esse desastre ocorreu? O Encontro não é um telejornal. É um programa de auditório, recheado de pautas que transitam entre o oba-oba com celebridades e ideias irrelevantes. No meio, números musicais, sessões de rebolado e promoção de novelas da casa.
Se nos telejornais propriamente ditos a parada já é insalubre, imagine quando um assunto como esse vira “debate” no tal universo do entretenimento. É danação na certa. Já não basta o “jornalismo” de Datenas da vida, aí vem a TV Globo e dá uma contribuição desse calibre para o teatro de bizarrices. Capítulo medonho na história da velha TV.
Nesse caso, o “cancelamento” de Patrícia Poeta é o menor dos problemas.
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